Parte do espólio do antigo Hospital Miguel Bombarda “em vias de classificação”

Quase 400 obras de arte produzidas durante mais de um século pelas pessoas internadas no primeiro hospital psiquiátrico do país estão a um passo de ser consideradas um Conjunto de Interesse Público.

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Uma pintura de Valentim de Barros, um dos mais conhecidos artistas do Bombarda, cujas obras de grandes dimensões precisam de restauro urgente Nuno Ferreira Santos
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Mais de 500 obras de arte, escritos, utensílios de uso clínico e outros objectos do antigo Hospital Miguel Bombarda entraram em processo de classificação como Conjunto de Interesse Público.

Com o despacho publicado esta quarta-feira em Diário da República pelo presidente da Museus e Monumentos de Portugal (MMP), Alexandre Nobre Pais, fica legalmente protegida uma parte do acervo clínico e artístico do primeiro hospital psiquiátrico do país, que funcionou em Lisboa até 2011.

A decisão agora conhecida é um resultado directo dos esforços levados a cabo desde há cerca de ano e meio por um grupo de voluntários que se dedicou a inventariar todo o espólio do Bombarda. Foi este grupo que submeteu o pedido de classificação em Dezembro de 2023.

Naquele hospital, escondido do olhar público na muito central Colina de Santana, as pessoas ali internadas​ produziram obras de arte durante mais de cem anos, desde o início do século XX até ao encerramento definitivo do equipamento, que desde então está num limbo urbanístico e em grande parte degradado e sem utilização.

Neste período de 14 anos “muita coisa desapareceu”, lamentava ao PÚBLICO, em Agosto, Ana Paula Santos, bibliotecária do Hospital Júlio de Matos que foi uma das dinamizadoras do grupo voluntário, juntamente com a psiquiatra reformada Amélia Lérias. Ainda assim, chegaram aos nossos dias cerca de 4000 obras de arte, cerca de 6000 fotografias e muitas dezenas de objectos de tratamento e diagnóstico.

As 518 peças que agora passam a estar “em vias de classificação” – gozando já da protecção legal que é conferida aos bens classificados – correspondem ao lote que o grupo julgava estar em maior perigo de degradação irreparável ou de desaparecimento.

Na lista que integra o despacho incluem-se 398 desenhos e pinturas (incluindo uma em lençol), poemas, versos, cartas e escritos diversos. Há ainda gaiolas, sinos, esculturas em fósforos e 120 objectos utilizados na prática clínica diária do hospital, onde se incluem vasos medidores, serras de amputação e aparelhos de electrochoques.

No Bombarda chegou a funcionar um pequeno museu de arte outsider (a arte dos marginalizados), à semelhança dos existentes em vários países de diferentes geografias. O destino a dar à colecção ainda é uma discussão em aberto, havendo quem advogue que ela deve ser exposta ali mesmo, onde foi produzida.

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